EDUCAÇÃO E APRENDIZAGEM DE ADULTOS:
ASPETOS CONCETUAIS E MODELOS TEÓRICOS
Segundo
a UNESCO (Recomendação de Nairóbi
sobre o Desenvolvimento da Educação de Adultos) a Educação de adultos “denota o conjunto de processos educacionais
organizados, seja qual for o conteúdo, nível e método, quer sejam formais ou
não, quer prolonguem ou substituam a educação inicial nas escolas, faculdades e
universidades, bem como estágios profissionais, por meio dos quais pessoas
consideradas adultas pela sociedade a que pertencem desenvolvem suas
habilidades, enriquecem seus conhecimentos, melhoram suas qualificações
técnicas ou profissionais ou tomam uma nova direção e provocam mudanças em suas
atitudes e comportamentos na dupla perspectiva de desenvolvimento pessoal e
participação plena na vida social, econômica e cultural, equilibrada e
independente; contudo, a educação de adultos não deve ser considerada como um
fim em si, ela é uma subdivisão e uma parte integrante de um esquema global
para a educação e a aprendizagem ao longo
da vida.” (cit. in Spezia, 2010:
13).
Nos
anos 70 a Educação Permanente surgiu inscrita numa ideologia
humanista, que defendia a “educação de adultos como projeto de transformação
social” (Anibal,2013:4)
Posteriormente, o
conceito de Aprendizagem ao Longo da Vida surgiu com
base numa ideologia “neoliberal e individualista (Friedman, 1985),
representada na visão de construir uma sociedade cognitiva, composta por
organizações qualificantes autónomas e empenhadas na salvaguarda dos interesses
privados (Drucker, 2000)”. (cit. in Anibal,2013:4)
A ALV é definida por Sitoe como “toda a
actividade de aprendizagem em qualquer momento da vida, com o objectivo de
melhorar os conhecimentos, as aptidões e competências, no quadro de uma
perspectiva pessoal, cívica, social e/ou relacionada com o emprego”.(Sitoe, 2006)
Foi a partir de
1997, com a quinta conferência da UNESCO (CONFITEIA V) que segundo Cavaco,
se substituiram expressões como “educação
permanente por aprendizagem ao longo
da vida, educação de adultos por
educação e formação de adultos e saberes e conhecimentos por competências .” (cit. in Anibal, 2013:5)
Enquanto que
alguns autores (como Dubar, Le Goff, Liétard , Finger e Asún, Canário, Lima e
Cavaco) se opôem a esta mudança do paradigma humanista para o paradigma
neoliberal, outros (como Ávila) defendem que estes complementam-se e que a
educação de adultos pode acompanhar a globalização e a sociedade de
conhecimento sem se afastar dos ideais humanistas. Tal como defendido por
Ávila e citado por Anibal “ nas sociedades atuais, a valorização das
competências dos indivíduos, em especial as de caráter transversal, não poder
ter, como noutros tempos, finalidades meramente ligadas à sua profissão,
trazendo vantagens para o indivíduo em muitos outros contextos e situações de
vida, pelo que “as competências e os modelos de formação valorizados no atual
contexto económico podem constituir um recurso de valor transversal nas
sociedades contemporâneas” (Anibal,2013;4).
Em 2009 os Estados-Membros da União Europeia reuniram-se e
firmaram através da Estratégia de Lisboa quatro objetivos comuns estratégicos,
visando a cooperação na educação e formação:
“Tornar a aprendizagem ao longo da vida e a mobilidade uma realidade”;
“Melhorar a qualidade e a eficiência da educação e da formação”; “Promover a
equidade, a coesão social e a cidadania ativa”; e ” Aumentar a criatividade e a
inovação, incluindo o empreendedorismo, em todos os níveis de educação e
formação”.Definiram ainda que “Como
parte dessa resposta, é reconhecido que a aprendizagem
ao longo da vida deve-se tornar uma realidade em toda a Europa, como uma
chave para o crescimento e o emprego, bem como um elemento crucial para a plena
participação na sociedade.”(Spezia,2010)
O período pós-moderno, acarreta desafios
associados às transformações económicas e tecnológicas e aos impactos destas
nos contextos laboral, pessoal e social. São-nos exigidas competências
cognitivas, comportamentais, emocionais e sociais que se adaptem a esta
constante mutação da realidade.
Gergen (1991) faz referência à “necessidade
que o indivíduo, neste período pós-moderno, tem de se diferenciar e se
reformular para ter uma adaptação bem sucedida e, neste sentido, introduz o
conceito de multifrenia que se traduz na capacidade permanente de reconstrução
e de criação do próprio, através da experiência e da vivência que as
oportunidades da vida vão colocando ao sujeito. O conceito não é inteiramente
novo. Já Rogers (1974) afirmava que a experiência é a fonte de maior validade
para o conhecimento, e mesmo que conduza ao erro, a experiência está sempre
aberta à correcção”. (cit. in
Quintas, 2008:14)
Esta é sem duvida uma das grandes potencialidades da educação de adultos e um ponto focal da
Andragogia: o Reconhecimento, validação e certificação da aprendizagem não formal e
informal, ou seja dos saberes e competências adquiridos através da
experiência.
Mas será a Educação de Adultos reconhecida socialmente?
Parece-me ainda um pouco desvalorizada
esta prática quer pela sociedade, quer pelos orgãos políticos e de
administração pública, em detrimento da valorização de projetos e ações educativas de
carácter formal e obrigatório.
O caminho seria em conjunto e de forma
integrada promover a educação de adultos e defendê-la enquanto direito do
cidadão.
Contudo a EA é ainda pouco estimulada e continua associada à
"força de trabalho tradicional" (Torres, 2003:7) e a uma formação
técnica para um emprego especifico, (normalmente ligado ao sector industrial) o
que não se coaduna com a versatilidade e volatilidade do emergente sector de
serviços característico da globalização.
Poder-se-ia enumerar várias razões para os governos investirem na
educação de adultos, entre as quais, a realização pessoal do cidadão; o
desenvolvimento de uma sociedade mais inclusiva e promotora de bem-estar; a
actualização de conhecimentos, técnicas e práticas; instrumento de
desenvolvimento de cidadania e emprego. Para além destas razões Torres faz
referência, ao direito constitucional de qualquer cidadão à educação, e aborda
também o facto de investimento em capital humano estimular o desenvolvimento
económico.
Contudo este argumento económico pode estimular
a criação da "doença da certificação" (Torres, 2003:62) ou seja, uma
permanente insatisfação e busca de certificados de competências e
conhecimentos, que é alimentada pelo mercado. Fomenta-se com esta visão
economicista e globalizacional uma homogeneidade de certificações nos mesmos
segmentos de mercado, que dificultam a empregabilidade e aumentos salariais, consequentemente
incitando a desigualdade económica e a individualização.
O expoente máximo
da educação de adultos é, a meu ver, aprender e educar em sociedade e, com base
nas experiências pessoais, sociais e profissionais, em busca do desenvolvimento
inclusivo e sustentável da sociedade global.
Creio que esta
não é uma visão utópica, mas sim realista quando pensada a uma escala micro
(local), que poderá um dia propagar-se a uma escala macro (sociedade).